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Resíduos em época de pandemia de Covid-19

by rafaelteoc

Eduardo Camargo*

Há pouco mais de um ano, quando começamos a falar dos problemas que estávamos encontrando e o que poderia surgir por conta da Covid-19, não sabíamos o impacto que tudo isso teria e o quanto iria influenciar nossas vidas, a geração dos resíduos e a cadeia produtiva dos materiais reciclados. 

Apenas para exemplificar, houve cidades que tiveram uma redução significativa em seus resíduos coletados: Belo Horizonte-MG, na ordem de 22%; e Campinas-SP, na ordem de 25%. Tal redução está relacionada especialmente a dois fatores: o primeiro é o fechamento de restaurantes, bares e lanchonetes, onde as pessoas consumiam diariamente nas grandes cidades; e o segundo foi a mudança nos hábitos de consumo proporcionadas por esse período,  já que, historicamente, a geração de resíduos possui uma relação direta com o poder aquisitivo. 

Em contrapartida, percebemos o aumento do sistema delivery, que impulsionou sobremaneira a cadeia do material reciclável, pois as pessoas foram instadas a alterar seus hábitos de compra e de recebimento de alimentos durante esta pandemia. Com certeza, essa mudança no relacionamento com o mercado e, também, com o fornecimento de refeições alterou em definitivo a relação de consumo. 

Se tem algo que não mudou desde que a pandemia chegou no Brasil, há mais de 365 dias, foi o aumento da procura por embalagens de papel e papelão em todo o país. Com o crescimento exponencial do e-commerce e a demanda vertiginosa por serviços de delivery, caixas e sacolas em diferentes tamanhos, formatos e materiais tornaram-se um produto de primeira necessidade para diversos setores, impactando a indústria de papel. 

Quem explica é o presidente do Sindicato das Indústrias de Celulose, Papel e Papelão no Estado de Minas Gerais (Sinpapel), Antônio Eduardo Baggio. Segundo ele, o setor sofreu e continua sofrendo com a elevação do custo das aparas, com o impacto do câmbio sobre insumos e peças, além de uma particularidade: a redução da reciclagem. Esta última ocorreu em virtude de mudanças no trabalho de cooperativas, catadores de papel e coleta seletiva.

Essa diminuição drástica do consumo e descarte de embalagens que alimentam a indústria de reciclagem de papel, bem como o abandono do ofício por muitos catadores devido a inúmeros motivos, desabastece a engrenagem da cadeia. 

Isso mostra quanto ainda caminhamos a passos lentos na cadeia produtiva dos reciclados, seja pela possibilidade de ganhos para cooperativas e catadores informais, por meio dos auxílios emergenciais do governo federal, seja pela falta de incentivos para campanhas e conscientização de toda a sociedade, para que a reciclagem se deparasse com essa minimização de material, mesmo com o colossal aumento de oferta gerado pelo cenário que apresentamos aqui. 

Há muito a ser feito nessa cadeia produtiva, deixando de lado o “empirismo” para efetivamente estruturar um plano de ação para o aproveitamento de todos os materiais recicláveis. Sabemos que grande parte dos valores recebidos pelos catadores fica para os chamados atravessadores, que fazem a compra do material coletado, muitas vezes à vista, para os catadores mais humildes e que, literalmente, ganham a vida catando papel na rua. 

Enquanto não houver uma política pública que veja a reciclagem como enorme fonte de renda e custo evitado, continuaremos engatinhando nesse tema. A própria Lei nº 12.305/2010, que  instituiu a Política Nacional dos Resíduos Sólidos, dispõe sobre a necessidade de inserção dos catadores no sistema de reciclagem.

Deixando claro que há regramento para se avançar, mas os agentes públicos ainda preferem relegar essa importante ferramenta ambiental para a filantropia rasa, permitindo que a forma rudimentar de coleta por meio de catadores continue se perpetuando, estando nosso país muito aquém de metas internacionais de reciclagem.

Fica aqui um desafio para podermos pensar nos famosos 3 Rs:

  • Reduzir – consiste em diminuir a geração por meio da redução no desperdício. O objetivo é comprar bens e serviços de acordo com nossas necessidades, adotando um consumo econômico e ambiental;
  • Reutilizar – quando um produto é reutilizado, acaba sendo reaproveitado na mesma função ou em diversas outras possibilidades de uso. A exemplo simples dos papéis de cadernos usados, que podem se tornar blocos de rascunhos ou garrafas a serem transformados em objetos de utilidade ou decoração;
  • Reciclar – envolve o processamento de um material com sua transformação física ou química, seja para reutilização sob a forma original, seja como matéria-prima para a produção de novos materiais, a exemplo de pneus usados que se transformam em componentes para asfalto, latas de alumínio fundidas novamente para dar origem a novas latas, e muito mais. 

Penso que essa pandemia nos mostrou a necessidade de nos tornarmos menos consumistas e um pouco mais minimalistas. Hoje, precisamos fazer aquela pergunta antes de comprarmos algo: preciso mesmo disso? Quantos de nós aproveitamos a maior permanência em casa e organizamos nossos armários? Será que não acumulamos em demasia? O consumismo desenfreado só é bom para quem vende. 

Isso também é educação ambiental, pois precisamos compreender que os recursos ambientais são finitos e que o consumo consciente e sustentável é a nossa mais especial alternativa.

 

* Engenheiro agrônomo e membro da ETIS com vasta experiência em prestação de serviços de gestão de empresas do segmento.